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Silas Ayres- antes de tudo um amante da liberdade

arlindenor pedro
Por arlindenor pedro 6 leitura mínima

Nosso grande amigo Silas nos deixou nesta madrugada de 7 de novembro de 2023.

Com sua saída de cena fomos tomados por uma sensação de um grande vazio.

Isto mesmo: Silas era um tipo de pessoa que sabia preencher estes espaços que temos no nosso dia-a-dia, sempre com uma opinião, sempre com um olhar atento para o que ocorria no país, e em volta de nós. Era uma pessoa muito corajosa: mesmo contra a corrente, mesmo em minoria, ele preocupava-se em explicitar o que pensava! .

Parece que sempre nos conhecemos. Mas, na verdade, nos aproximamos de fato nas Jornadas de junho de 2013. Ali, no meio da garotada, nas ocupações, passeatas e barricadas, na busca do entendimento do que ocorria, fomos construindo um pensamento conjunto sobre este novo momento do capitalismo-um capitalismo em crise estrutural. Silas era incansável agora. Não perdia uma manifestação, sempre acompanhado de sua já tradicional máquina fotográfica. Queria registrar estes novos momentos e refletir teoricamente sobre eles.

Da perplexidade inicial saltamos para o entendimento de que o mundo mudara. Aquela garotada aguerrida, enfrentando as investidas da polícia numa lógica diferente da que tivemos em 68, nos mostrava isto. Era outra estética, outra postura.

Verdade: não estávamos mais nas lutas dos movimentos operários do século XX. Agora estávamos no furacão das lutas emancipatórias do século XXI, onde a individualidade das reivindicações dos cartazes feitos à mão substituía as faixas dos partidos e sindicatos. Sem caminhões de som, sem discursos dos sindicalistas.

Mas, nós sabíamos, por experiência própria, que logo a força da mão do Estado se abateria sobre aqueles jovens. E foi o que ocorreu: a repressão se abateu com a força do tacão de ferro nas costas dos manifestantes dos inúmeros movimentos de ocupação de ruas, passeatas, invasões, etc. Mandados de prisão foram emitidos, computadores foram confiscados. A Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática substitui o antigo DOPS e DOI-CODE dos nossos tempos de anos de chumbo. Surpresos, os manifestantes das ruas foram jogados no Sistema Carcerário, enchendo as prisões. Estes jovens idealistas conheceram então a lógica repressiva da justiça no Brasil, sendo feitos julgamentos sumários, onde as penas chegaram a mais de 20 anos.

Por iniciativa do Silas fizemos o que sabíamos fazer: criamos uma rede de solidariedade para aqueles jovens. Através de nossos amigos colhemos dinheiro e mesmo chegamos a esconder da repressão os líderes que estavam sendo mais procurados. A extensa rede de amigos que Silas construíra em toda a sua vida foi de fundamental importância agora.

Com o refluxo dos movimentos de ruas procuramos nos conectar com os diversos movimentos teóricos anticapitalistas no Brasil e no mundo, com o intuito de melhor entendermos o avanço da extrema-direita, que naquele momento substituiu os jovens nas ruas. Silas foi fundo no entendimento das propostas regressivas do Tradicionalismo Conservador e se tornou um palestrante para aqueles que queriam nos ouvir. Montamos grupos de estudos, trouxemos ao Brasil teóricos da crítica do Valor, organizamos eventos em faculdades e em grupos virtuais.

Para fortalecermos o bloco anticapitalista estruturamos meios de comunicação na web. Silas foi um dos pilares da construção de uma Revista Eletrônica de caráter anti capitalista nas Redes Sociais e também na difusão de um blogue na internet com este mesmo caráter.

Sua morte é sem dúvidas um grande baque. Carecemos neste momento de quadros de esquerda que operem no entendimento de que não existe saída possível na lógica da sociedade capitalista. Como ele não se cansava de dizer: “não existe nenhuma condição de administramos a barbárie”. Todas as nossas energias têm que estar dirigidas para a luta anticapitalista. Temos que formar quadros de massa com um perfil claro anticapitalista. Temos que insistir com as lideranças de esquerda no nosso país para que se coloquem neste campo de luta. Insistir para levarem o povo a enxergar a causa real das dificuldades em que estamos imersos: a sociedade capitalista em que vivemos.Silas acreditava nisto e era antes de tudo um amante da liberdade humana. Amante da emancipação.

Amigo Silas, estamos aqui para prantear a sua morte. Mas, a nossa tristeza não matará nosso ímpeto. Estamos velhos, sabemos disso. A maioria de nós, como você, já passamos por muitas coisas. Durante nossa trajetória tivemos muitos dissabores. Mas, mesmo assim, somos ainda otimistas.

Como você, nos colocamos sempre no campo da esquerda. Orgulhamo-nos do nosso passado. Mas, estamos antenados com o futuro. Mesmo que dele não participemos, não nos afastaremos do caminho de barrar a barbárie que está se implantando em todo o mundo. Usaremos de todos os meios possíveis para não deixarmos morrer o seu legado. Um legado de lutas pela liberdade que sabemos só conseguida com a emancipação do homem das teias fetichistas da sociedade da mercadoria.

Serra da Mantiqueira, 7 de novembro 2023.

Arlindenor Pedro

Em memória de Silas Ayres publicamos aqui uma entrevista onde ele nos mostra um pouco da sua trajetória política, como jovem de esquerda na luta contra a ditadura militar . Um vídeo gravado em 24 de novembro de 2016.

uma conversa com Silas Ayres

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Libertário - professor de história, filosofia e sociologia .
3 Comentários
  • Qq é isso? Q aconteceu com ele? Inacreditável a forma como estamos sendo retirados da cena da vida seguidamente todo dia. Sem despedidas. Sem nada.
    “De repente. Não mais que de repente”.Isso doi.Dmais

  • Parabéns, Arlindenor, bela e justíssima homenagem a esse querido combatente da liberdade, um anticapitalista convicto.
    Honraremos a sua memória não deixando em paz os fascistas e autoritários, agentes da barbárie. Continuaremos na luta pela emancipação da classe trabalhadora.
    A luta continua!

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