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O massacre no Rio de Janeiro, com mais de 120 mortos em operação policial, escancara a barbárie cotidiana que se tornou norma no capitalismo em colapso. Para entender esse processo, temos publicado nos últimos dias inúmeros textos de nossos colaboradores sobre esta tragédia . Dentro deste contexto vale assistir à entrevista com o professor Marildo Menegat no programa O Livro que Estou Lendo, apresentado por Arlindenor Pedro, do Blogue Utopias Pós-Capitalistas. No programa, gravado por ocasião do lançamento de seu livro “A guerra não tem paz”, Menegat mostra como a violência não é exceção, mas lógica estrutural do capital em crise. A crítica do valor aparece aqui como chave teórica para compreender por que a guerra se tornou a forma de vida na sociedade em que vivemos.Assista ,leia a resenha e compartilhe: pensar criticamente é um ato de resistência.

A barbárie como norma
Os fundamentos da violência- uma entrevista com Marildo Menegat
Resenha Crítica: “A guerra não tem paz” e a crítica radical do presente
1. Introdução: A barbárie como racionalidade do capital
A entrevista com o professor e filósofo Marildo Menegat, realizada por Arlindenor Pedro, editor do Blogue Utopias Pós-Capitalistas – Ensaios e Textos Libertários, no programa O Livro que Estou Lendo (transmitido no canal do YouTube da mesma plataforma), é mais do que uma apresentação de seu novo livro. Trata-se de uma imersão teórica profunda no diagnóstico sombrio e preciso da crise histórica do capitalismo. Gravado por ocasião do lançamento de seu mais recente trabalho, “A guerra não tem paz – Estudo sobre o sentido violento e destrutivo do fetichismo do capital”, o programa, que foi ao ar no dia 03/11/2024, com mais de uma hora de duração — contou com um ambiente de forte interação, fruto da afinidade crítica entre entrevistador e entrevistado, ambos comprometidos com uma análise radical do colapso da forma social capitalista.
2. Desenvolvimento: Guerra generalizada e dissolução das mediações
Menegat constrói sua argumentação em torno de um conceito central: o da guerra generalizada como forma histórica da barbárie capitalista. A guerra, nesse contexto, não é um evento externo ao capital, mas sua própria dinâmica social normalizada em tempos de crise estrutural. O colapso da mediação estatal e da política moderna conduz à disseminação de formas armadas difusas – milícias, facções, seguranças privadas – configurando uma sociedade onde o uso da força se autonomiza como forma de regulação social.
Essa guerra não é espetacular, mas cotidiana. A necropolítica torna-se gestão ordinária, o que Menegat chama de “barbárie administrada”. As funções tradicionais de integração social (escola, religião, trabalho, família) perdem seu poder normativo e são tomadas pela lógica da sobrevivência violenta. O Estado-nação, enquanto estrutura de mediação e controle centralizado, dissolve-se em fragmentos.
3. A crítica do valor dissociação como ruptura categorial
O ponto alto da intervenção de Menegat está em sua fidelidade teórica à crítica da totalidade categorial do capital. Como em Robert Kurz ou Roswitha Scholz, o capitalismo é interpretado como uma forma histórica específica de subjetividade e sociabilidade mediadas pelo valor, pelo dinheiro e pelo trabalho abstrato. Não se trata de reformar o sistema, mas de questionar suas próprias categorias constitutivas.
O fetichismo, neste quadro, deixa de ser um engano ideológico e passa a ser compreendido como estrutura objetiva da forma social. É o próprio valor que se autonomiza como sujeito (o “sujeito automático”, segundo Marx), submetendo os indivíduos a uma lógica alienada, violenta e destrutiva.
4. Crítica à esquerda tradicional e limites da política
Menegat é implacável com a esquerda tradicional. Sua crítica vai além de erros táticos ou estratégicos. Ele afirma que, ao operar dentro das categorias do capital – trabalho, Estado, economia, política, direito – a esquerda acaba apenas reproduzindo o mundo que pretende superar. A política institucional tornou-se incapaz de responder à crise estrutural do capital porque está enredada nas suas formas.
A alternativa, segundo ele, não é propor “soluções” funcionais, mas recusar as perguntas impostas pela lógica dominante. O gesto teórico radical consiste em suspender o desejo de resposta imediata e abrir espaço para uma crítica que rompa com as formas sociais fetichistas, sem cair em utopismos voluntaristas.
5. Conclusão: O papel da teoria crítica diante do colapso
A principal contribuição do programa está em reafirmar o papel da teoria crítica não como instrumento de gestão da crise, mas como lucidez diante da catástrofe. A crítica do valor, atualizada por Menegat, não oferece atalhos para a emancipação, mas uma clareza rigorosa sobre a profundidade da barbárie em curso.
Em um tempo em que a violência se tornou a gramática do cotidiano, em que o colapso ecológico, político e social se aprofunda, a tarefa da teoria é manter viva a possibilidade de imaginar uma forma de vida para além do valor, do dinheiro e da guerra – mesmo que hoje essa possibilidade pareça bloqueada. Menegat nos convida a pensar o impensável: a negação radical da sociabilidade capitalista como única chance de redenção histórica.
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