Imagem de Igor Morki
ADEUS ÀS ILUSÕES!
Está em andamento uma questão fascinante e, ao mesmo tempo, perigosa.
Trata-se da 4ª revolução tecnológica em curso que aponta para transformações que, se mantiverem inalterado o seu fundamento, terão consequências incomensuráveis para a história da humanidade e do planeta.
Através dela iniciou-se o processo de seres projetados, ou seja, de produção de um ser humano com genoma direta e deliberadamente editado. Não se trata mais da edição de genes de plantas e animais, mas da alteração do DNA de embriões humanos. Por outro lado, pesquisas recentemente realizadas por meio de neurotecnologias apontam para a existência do 1º ser humano com memória totalmente artificial implantada no cérebro.
Em consonância com essas experiências, inúmeras outras atividades industriais e tecnológicas estão em andamento. Baseadas na robótica, neurotecnologia, nanotecnologia e biotecnologia elas irrompem com velocidade, amplitude e profundidade quase ilimitadas. Através delas bilhões de pessoas passam a ser conectadas por dispositivos móveis com base na computação quântica.
Essas inovações industriais e tecnológicas alcançam numerosas áreas como a possibilidade de criação em série de seres humanos, do uso ilimitado da inteligência artificial, da internet das coisas, veículos autônomos, impressão 3D, ciência dos materiais, armazenamento de energias, digitalização planetária, tecnologias implantáveis e vestíveis, supercomputador de bolso, casa conectada, cidades inteligentes e flutuantes, Big Data, todas elas provocando mudanças profundas na produção, consumo, transporte, sistemas logísticos, atividades governamentais, em todas as instituições bem como o redimensionamento dos papéis da comunicação, educação, saúde, meio ambiente, segurança, etc. Uma transformação que atinge em extensão e profundidade a maneira como vivemos, trabalhamos, estudamos, pesquisamos, criamos, nos divertimos, e como nos comunicamos e nos relacionamos.
A quarta revolução industrial não tem paralelo com as revoluções anteriores. Senão vejamos: na 3ª revolução industrial o capitalismo, com base na microeletrônica, reduziu drasticamente o trabalho; na 4ª revolução industrial se aproxima do seu fim.
Na 3ª revolução industrial a natureza foi submetida a um ecocídio que punha em jogo a existência do ser humano e do planeta; na 4ª revolução industrial, estamos diante de um processo cuja devastação não só compromete, mas pode eliminar a vida no planeta.
Se na 3ª, os investimentos reais deixaram de ser rentáveis, pois foi reduzida drasticamente a valorização do capital como consequência da perda da substância do trabalho; na 4ª, nos depararemos com a dessubstancialização quase absoluta do capital com o colapso total do sistema na vigência do dinheiro sem valor. Se na 3ª, o moderno sistema patriarcal produtor de mercadoria originou um pensar e agir autoritários de extrema direita, racistas e sexistas; na 4ª, nos defrontaremos com o neofascismo apto a eliminar bilhões de pessoas.
Se o capitalismo na 3ª, impôs o namoro renovado entre o mercado e o estado, acreditando que através da fuga para a frente, ao utilizar crédito público e especulação financeira contornaria os seus obstáculos, se deparou com uma crise inusitada (2008) que não só atingiu todos os países, inclusive o Brasil (2015), mas mostrou de forma cristalina o limite interno e externo do sistema; na 4ª, com o fracasso dos papéis do estado e do mercado originou-se uma dinâmica de destruição sem precedentes, com uma massa de seres humanos miseráveis e objetivamente supérfluos, a exemplo dos refugiados, mas não só, acabando com as bases sociais, econômicas, políticas, culturais e ecológicas da cada vez mais exígua vida social.
Se o capitalismo, na 3ª revolução industrial tolerou um precário estado de direito voltado aos ainda aproveitáveis para o trabalho; na 4ª, adotará medidas de emergência configuradas num estado de exceção para tentar administrar o caos de sua crise final.
Se na 3ª, o capitalismo se deparou com seu projeto de modernização em escala mundial fracassado; na 4ª, tentará sobreviver expandindo as ideologias do ódio, fanatismo religioso, terror, guerras civis sem rumo, populações mergulhadas no pântano da pobreza e desespero com uma escalada da violência sem precedentes contra as mulheres, participantes dos movimentos LGBT, negros, jovens e os proscritos teóricos e práticos dedicados à luta pela suplantação do capitalismo.
O fato do capitalismo ter atingido os seus limites facilitará a nossa emancipação?
O capitalismo se sufoca por causa da sua própria lógica. Mas, se a catástrofe está programada, de forma alguma está a sua superação, como evidenciam os acontecimentos no Brasil.
Os “antigolpistas”, independente da intenção, da boa vontade e dos bons propósitos de quem quer que seja, fazem o jogo dos “golpistas” quando denunciam o golpe e participam dele.
Quando se mantêm aprisionados em suas bandeiras modernizantes como o Fora Temer, Diretas Já e chamamento para lutas única e exclusivamente imanentes que, embora justas, são submetidas à forma capitalista e, com isso, não abrem nenhuma perspectiva para uma luta transcendente ao sistema.
Diariamente dão demonstração de seus esforços para manter a nossa gente sujeitada ao sistema com suas categorias fundantes (trabalho, mercadoria, valor-dissociação, dinheiro, fetichismo, mercado, estado, economia, política, sujeito, …).
Não querem ouvir, nem falar e nem ver a crise do limite do capitalismo. Insistem em nos manter aprisionados numa conjuntura que nos mostra que nesse sistema, nessa situação do Brasil e do mundo, não há mais futuro diante de nós. Negam peremptoriamente que o rombo que o sistema ocasionou no seu próprio casco não é mais consertável.
Amenizam a evidência de que seu elevador social inverteu sua direção e agora só consegue alimentar a negatividade. Ocultam que o sistema só nos permite a possibilidade de escorregarmos ao longo do declive um pouco menos rápido que outros países.
Tornam-se enraivecidos com a crítica radical por sua demonstração de que o capitalismo, ao se fazer triunfante com a 3ª revolução industrial, aniquila-se a si mesmo com o advento da 4ª. Ficam estupefatos diante da reflexão que demonstra que a história do capitalismo é a história da construção do sujeito e não simplesmente da dominação do sujeito.
O presidente do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, em seu livro A Quarta Revolução Industrial (edipro), argumenta que a contradição entre a inovação tecnológica e a produtividade “é um dos maiores enigmas que antecede o início da Grande Recessão e para qual não há uma explicação razoável.” (Pág. 38)
Um pensador prospectou, há exatamente 158 anos atrás, que essa constatação é resultado da contradição em processo da produção capitalista que aponta a última manifestação do valor.
Como o valor é o fundamento da produção burguesa, essa contradição em processo mostra cristalinamente a fronteira histórica do moderno sistema fetichista patriarcal produtor de mercadorias, o capitalismo. Esta realidade se aproximou desse pensamento no final do século XX.
Por que não deveríamos então lutar decididamente para que, através da crítica categorial, essa crise seja sinônimo de uma revolta consciente e livre de nossa gente para a conquista da emancipação humana? Isso não passa por partidos políticos, muito menos aqueles em que seus chefetes estão envolvidos em escândalos e corrupção. Não passa também pela substituição de uma dominação pela outra. Nem por ação de protagonistas políticos ligados à forma política. Menos ainda por lutas imanentes submetidas à forma capitalista. E, acima de tudo, jamais por visões e ações revolucionárias desprovidas da teoria e da prática emancipatórias.
Afinal, estamos diante de uma oportunidade histórica para essa luta emancipatória. Em primeiro lugar, porque tornou-se possível fundamentá-la. Segundo, porque há uma conjunção histórica que nos permite conquistá-la. Terceiro, cresce a consciência para não suportar mais a administração da crise com sua barbárie que ameaçam de extinção a humanidade e a natureza. E, em quarto lugar, descobriu-se que nós, pessoas humanas desfetichizadas e no papel de antissujeitos, poderemos realizar essa façanha histórica.
Nunca houve um período da história do Brasil e da humanidade em que a nossa vontade consciente tenha tido uma importância tão decisiva como tem agora para a superação da crise com a suplantação do capitalismo e a conquista da emancipação.
Um abraço!
Fortaleza, setembro de 2016
Critica Radical