Para Mário Quintana
‘Era o velhinho e o frio.
Atlântica com Duvivier:
lavanda inglesa,
cachecol quadriculado,
casaco azul de cashmere.
Um lorde, um rei, um nobre,
“sua alteza”, com certeza.
Ah, o pigarro!
Conhecia aquele ‘ran-ran’
igual ao do meu avô.
Esse, o único ponto em
comum.
Meu avô era mal vestido,
um Carlitos esfarrapado.
Todas as horas, todos os dias
usava roupas baratas
compradas na Casa Mathias.
Cheirava a mata-rato
(pacotes e mais pacotes)
que fumava num só ato.
Mas tinha um canário
cantador,
pé de manjericão na janela,
perpétuas num vaso de flor.
E,embora, sem eira nem beira,
se equilibrava todo galante,
no estribo do bonde Piedade,
lá na Praça da Bandeira.
Me bateu uma saudade
(uma dor forte e sacana)
na tarde fria e chuvosa,
naquela esquina
de Copacabana.’
No livro ‘Transgressão’ 1997
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