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Por que as crianças estão com perfis nas redes sociais se é proibido?Virginia Loureiro

arlindenor pedro
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Por que as crianças estão com perfis nas redes sociais se é proibido?um artigo de Virginia Loureiro

uma sociedade que permite que se explore a mão de obra infantil é uma sociedade doente

Esses dias, estava conversando com meu filho e meu companheiro sobre a recente denúncia do influenciador digital Felca a respeito da adultização infantil. Essa denúncia causou reação na sociedade — não pela surpresa, pois estamos dessensibilizados ou cegos para todos os tipos de barbáries que nos cercam a todo momento, mas não reagimos por termos nos transformado em sujeitos cujas relações sociais são determinadas pela mercadoria, que aprisiona nossa existência e nosso imaginário.

A reação imediata costuma vir acompanhada de um “Nossa! Que horror! Isso estava acontecendo e eu nem sabia!”. Claro que sabíamos! Sabíamos, mas ignorávamos — assim como ainda ignoramos as mortes diárias de crianças em Gaza, os estupros nos gigantescos campos de refugiados e por aí vai.

Quem não sabe que, para ter um perfil em uma rede social, é preciso ter idade acima de 18 anos?

O que quero abordar, de fato, é a exploração velada por trás de conteúdos com a participação de influenciadores digitais mirins — quase sempre com imposição das famílias, omissão do Estado e sustentada pelos nossos “likes”, visualizações e comentários.

A utilização da mão de obra infantil para compor a renda familiar não é um fenômeno da contemporaneidade. Desde os primórdios do capitalismo, essa parcela da população foi imprescindível para o apetite voraz do capital em gerar o máximo de mais-valia. No período da Revolução Industrial britânica, na época de Marx, crianças de 4 ou 5 anos já trabalhavam em turnos de 12 a 14 horas, sob condições extremamente duras. Na indústria têxtil, cerca de 30% a 60% da força de trabalho era composta por crianças; desse percentual, aproximadamente 20% tinham menos de 13 anos. Sem contar que, no trabalho nas minas, a exploração infantil era essencial para acessar espaços reduzidos.

Naquele período, sem políticas públicas voltadas para qualquer tipo de auxílio social, a miséria dos trabalhadores forçava as crianças a participar dessas extenuantes jornadas.

Não foi à toa que o inquieto Marx se dedicou a “destrinchar” o caráter do capitalismo e a criar o Manifesto do Partido Comunista, visando organizar a luta dos trabalhadores.

E hoje, o que mudou? Podemos dizer com certeza que as políticas públicas apoiam a infância com leis, escolas, acolhimento e apoio financeiro para famílias. Mas muitas coisas burlam essa rede de proteção. Uma delas é o trabalho — sim, trabalho — envolvido na criação de conteúdos para redes sociais, que, a meu ver, se tornou o “chão de fábrica” do capitalismo 5.0.

São jornadas extenuantes para produzir vídeos que absorvem quase todo o tempo dessas crianças e jovens. Quem não acompanhou o caso da jovem Vanessa Lopes, que teve um surto durante sua participação em um reality show da Rede Globo? Naquele momento, já era adulta, mas sua carreira nas redes começou aos 14 anos, com rotinas pesadas de produção de conteúdo. Para alimentar a voracidade dos algoritmos, é preciso manter um alto nível de postagens. Muito pior foi a reação de pais que, num primeiro momento, negaram o surto para que sua “mina de ouro” não precisasse interromper a produção. Situações semelhantes parecem comuns na vida de muitos influenciadores mirins.

Além da exploração emocional, da negligência e da exposição pública — que resultam em traumas como ansiedade, vergonha e problemas de confiança —, esses pequenos influenciadores são trabalhadores. Se já há leis de proteção para crianças e adolescentes, garantidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente contra abuso e exploração, não há razão para que não sejam aplicadas.

O documentário Má Influência: O Lado Sombrio dos Influencers Infantis, disponível na Netflix, reforça os riscos desse cenário.

É urgente voltarmos nossos olhares para esses trabalhadores mirins. É preciso proibir a exploração e o abuso em um ambiente que lucra com comportamentos naturais da infância, sem limites ou proteção — repetindo a lógica de extração de mais-valia sobre territórios vulneráveis, agora psicológicos e emocionais, e que se estendem ao físico quando consideramos o tempo de trabalho a que essas crianças e jovens são submetidos.

Virginia Loureiro é editora do Blogue Utopias Pós Capitalistas-Ensaios e Textos Libertários

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Libertário - professor de história, filosofia e sociologia .
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