
Flutuo, pairo no ar. Na leveza de meu corpo danço lentamente no cubículo que ocupo. Passaram-se dias, ou serão apenas horas? Não sei! Há muito que o tempo nada significa para mim. Lá fora ouço o clac-clac- sinal do abrir e fechar da geladeira. Tento voltar ao chão. Inútil, não consigo. Um grande torpor tomou conta de mim. Será a pressão? Mas… minha pressão sempre foi tão boa?! Apalpo-me. Nada sinto. Será que estou inchado? Será que se esqueceram de mim ? Não! Daqui a pouco eu sei que eles virão novamente. Por que demoram tanto? Essa espera me tortura! E esses gritos que não param. Não consigo me acostumar com eles. Não sei se comi. Há tempos que não me alimento. Sinto sede. Acho que isso é bom, meu corpo está reagindo, passo a senti-lo comigo. Dei para ver pássaros, centenas deles. Voam, voam, aos bandos em um imenso céu azul. Fazem grandes algazarras com seus grandes bicos. Abro os olhos. Nada vejo, existe apenas o de sempre… a escuridão, o ruído incessante do exaustor drenado o ar. E o frio, o gelo que tomou meus pés. Lá fora os gritos. Ouço passos. São eles, eu sei que são eles! Quisera acordar do pesadelo.
Presidio Hélio Gomes, dezembro de 1976
Arlindenor Pedro